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Com prazo próximo, governo finaliza explicações sobre Pix para os EUA
Brasil quer mostrar que ferramenta ampliou bancarização e negócios, mas americanos estão preocupados com perda de fatia de mercado e coleta de dados
Por Rogério Alves
Publicado em 12/08/2025 20:16
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Pix / Crédito: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
 
Pix / Crédito: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A uma semana do prazo dado ao Brasil para a apresentação de explicações no âmbito da investigação aberta pelos Estados Unidos em que acusa o país de adotar práticas desleais de comércio, o governo Lula finaliza o arrazoado sobre um dos pontos mais caros politicamente a essa administração: a situação do Pix.

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O Executivo brasileiro pretende mostrar que não se sustentariam os argumentos de que o sistema público de transferência de recursos estaria minando a competitividade de empresas privadas, sobretudo americanas, como as operadoras de cartão de crédito.

Maré subiu para todo mundo

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, ofereceu recentemente uma prévia dos argumentos que o governo brasileiro tem para combater “falsas narrativas” sobre o Pix. Dados apresentados por ele mostram que o uso de cartões de crédito e débito subiu entre 2021 e 2024, inclusive acelerando após a massificação da ferramenta.

Segundo Galípolo, o ritmo de crescimento das transações com cartão de crédito passou de 13,1% ao ano nos dez anos anteriores ao Pix para 20,9%, entre 2020 e 2024. No total de cartões, o ritmo subiu de 14,8% para 19,7% (incluindo débito e pré-pagos), na mesma base de comparação.

A explicação do presidente do BC, que está sendo incorporada pelo governo, é que o Pix ampliou a bancarização e, consequentemente, as possibilidades de negócios, especialmente com pequenas empresas, o que elevou as oportunidades dos diferentes instrumentos de transação. “Isso elimina qualquer possibilidade de rivalidade, ou que um estaria canibalizando o outro”, argumentou.

Outras preocupações de empresas de cartões

A insatisfação dos americanos, porém, parece ter outras motivações. Mais grave do que deixar de obter receitas de 3% a 5% por pagamento na competição com o Pix, as duas maiores operadoras de cartão perderam o virtual duopólio da coleta de dados que essas operações financeiras geraram para elas na última década, fonte da maior parte dos seus lucros. Ou seja, as duas gigantes internacionais, que também são empresas de IA, já não dominavam o chamado data analytics.

Dentro do governo, e esse tem sido tema de debate desde o G20, onde foi exibido como estudo de caso de sucesso, o Pix também tem a ver com a soberania digital. Foi uma forma de democratizar e descentralizar a coleta e o processamento de dados, abrindo espaço para a inovação de empreendedores e empresas e geração de receita tributada no Brasil.

Outros temas

Pix não é a única “prática desleal” apontada pelos americanos. Ele é um dos itens incluídos na investigação aberta com base na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 — legislação que prevê a investigação de práticas estrangeiras desleais que impactam o comércio americano. Estão ali também o descontrole de desmatamento ilegal, falta de combate à corrupção e de acesso ao mercado de etanol e a venda de falsificados no comércio da Rua 25 de Março, em São Paulo, além do suposto cerceamento a redes sociais americanas.

A resposta será encaminhada ao governo americano pelo Itamaraty em forma de relatório detalhado. A investigação foi aberta no mesmo dia 9 de julho em que a Casa Branca enviou ao Brasil carta de Trump em que condiciona a tarifa de 50% à interferência no processo de Jair Bolsonaro. Ou seja, essas são as duas trilhas de negociação abertas pelos Estados Unidos. Na da investigação, que em princípio pode durar de seis a 12 meses, ou mais a depender da leitura dos americanos das explicações brasileiros, Brasília vê caminho para se negociar. Na da carta, só se Washington estiver disposta a deixar de lado o ataque político-institucional ao país.

Haddad e Bessent

Em meio à tensão política com os Estados Unidos, o governo brasileiro ganhou mais uma fonte de dor de cabeça. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, informou nesta segunda-feira que a reunião virtual que ele havia marcado com o secretário do Tesouro americano, Scott Bessent, foi cancelada sem maiores explicações.

Com mais uma demonstração de desprezo da administração Trump ao governo brasileiro, Haddad tratou de tentar jogar a conta mais uma vez no bolsonarismo. Disse que o encontro foi sabotado por Eduardo Bolsonaro, deputado e filho de Jair Bolsonaro, que tenta fazer avançar no Congresso o projeto de anistia. Ele, de todo modo, só teria tido um encontro com Bessent, na Califórnia, em maio deste ano, antes do tarifaço.

Seja como for, o revés do cancelamento da reunião tem gosto amargo para o governo Lula, que apostava em mais este canal para ampliar as exceções ao tarifaço e reduzir os impactos em termos setoriais e na economia de forma geral.

Finalizando pacote de socorro

Com o jogo negocial seguindo truncado, o governo corre contra o tempo para anunciar medidas de socorro para os atingidos. Apesar do reforço que haverá no lado do crédito, o governo também dará suporte com recursos fiscais. A possibilidade de uso do Reintegra para empresas de médio e grande porte avançou, mas havia uma discussão de fazer conforme o perfil setorial, dosando entre os mais e os menos atingidos.

Também estavam na mesa medidas como diferimento (adiamento) no recolhimento de impostos, além dos já noticiados programa de compras governamentais de alimentos que seriam exportados para os EUA.

Além disso, uma ala do governo estava querendo incorporar na medida provisória com as medidas de socorro uma versão do PL que recria o BNDES Exim, como forma de fomentar as exportações.

A tese, contudo, não é consensual, já que outros atores preferem que o PL que trata do financiamento às exportações, inclusive de serviços, e recria o Exim, avance de forma mais completa e negociada, uma vez que não tem tanta urgência e ainda poderia complicar o ambiente para a MP.

Fonte:logo-jota

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